sexta-feira, 3 de abril de 2015

Caminhos de vida

(Foto de Paulo Alves)

Caminho nostálgico pelas ruas abandonadas da minha mente. Não vejo gente, sigo pesaroso, por ausência de vida!
Os novos foram-se, poucos são os resistentes. Os heróis ainda deambulam pela aldeia, aqueles que regressaram da emigração, ou os outros que se mantiveram com o cordão umbilical ligado à terra que lhes deu o sustento.
Teimosia? Falta de oportunidades? Ou amor pela terra? Independentemente das razões, foram alguns que se mantiveram unidos, preservando as raízes e as memórias dos antepassados e as suas tradições. Estes guardam ainda “frescas” na memória histórias de outros tempos, tempos em que a vida se centrava na comunidade predominantemente agrícola.
Tempos em que as tabernas; os clubes e os largos das aldeias, eram o centro de encontro de todas as gerações.
No fundo era uma família unida, todos se conheciam e se ajudavam mutuamente. O vizinho levava aos mais próximos produtos das suas colheitas, recebendo sempre em troca um puro sorriso e uma palavra de agradecimento sincero. Além do que também seria bafejado por uma dádiva, que não pedia, mas que era como um acordo selado entre todos. O dar, não pressupunha nada em troca, eram-no assim por tradição das gentes do interior, e ainda preservam tais hábitos nalgumas regiões.
O “cibo” (expressão usada em Trás-os-Montes, para designar um bocado, um pedaço) de pão e o copo de vinho, não se negava a ninguém, nem aos estranhos à aldeia que eram bem recebidos, quer com as oferendas quem com a simpatia que caracteriza as gentes humildes das aldeias. Gentes ainda não totalmente conspurcadas pelo consumismo desenfreado; pelo materialismo e pelas novas tendências desta sociedade decrépita, onde prevalecem valores contrários à génese do próprio ser humano, ou pelo menos valores que devem reger todo o homem honrado.
Esse orgulho, das tradições; das gentes; da vida passada na aldeia; das dificuldades, esculpiram muitos daqueles que como eu tiveram que cinzelar a sua própria vida, buscando o sustento noutras paragens, mas sempre respeitando e amando as suas origens a sua terra e as suas gentes.
Ainda hoje as memórias me povoam a mente, trazendo-me sorrisos de momentos aprazíveis da mocidade, mas também alguns dolorosos, como o é a partida de amigos, familiares ou vizinhos.
Mas, é bem sabido que o momento fatídico a todos chegará, ainda que a sociedade actual tema falar em tal tabu. Mas esse tema, apenas nos deve ajudar a viver sabiamente cada dia da nossa vida, dando valor aquilo que realmente o tem, afastando-nos de pensamentos ou atitudes negativas, que prejudiquem a nós próprios ou a terceiros.
Não fica satisfeito quem me lê, em ver uma criança a sorrir; um idoso a ser acarinhado, um valor a ser cultivado, fazendo com que as acções positivas nos contagiem e nos façam sentir bem?
Acima de todas as religiões, são os valores humanos que todos devemos cultivam e que devem assenhorar-se do nosso espírito. Mais que as orações, são as acções que demonstram o nosso querer e através desses exemplos, possamos ser seguidos pelas gerações mais novas.
Foi através da vivência passada, das experiências adquiridas, dos ensinamentos dos progenitores e de todos os anciãos da aldeia, que esculpi a personalidade que habita nas minhas entranhas. Assim o foi com todos os seres humanos, cada um edificou a sua personalidade.
Estes pensamentos percorreram-me a espírito, numa época em que vejo o castelo civilizacional a desmoronar-se a olhos vistos.
Mas a esperança, essa palavras que enche o destino, deve ser o centro da nossa vontade. Esperança num mundo melhor, um mundo no qual todos nós, pequenas formigas participamos, contribuindo para um país, para o mundo, que esperamos seja melhor e esperançoso para os nossos filhos. Não cruzar os braços é pois uma boa ideia, lutando incansavelmente pelo bem-estar comum …


João Salvador – 03/04/2015

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