sábado, 24 de novembro de 2012

Apanha de medronhos


Passeio pela orla do rio

Naquela manhã caminhava calmamente pela beira do rio “torto” em Sanfins, observando e sentindo a presença da natureza a penetrar a minha pele; o meu corpo e todo o meu ser. 

Os sons característicos dos pássaros que esvoaçavam despreocupados, namorando os céus com uma intensidade de vida contagiante.

Andava eu como o fazia frequentemente quando criança, junto aos moinhos antigos, agora abandonados, um dos quais de meus país. 
Pensamentos melancólicos e de saudade afloravam-me na memória.

(Moinho abandonado)

Como me sentia bem ali, sorvendo cada pedaço da natureza, cada partícula daquele oxigénio puro que se entranhava e me polvilhava de vida purificando-me a alma.

Estava no mês de Outubro e o meu maior propósito naquele passeio, prendia-se com o reviver o aroma dos frutos silvestres, que na minha infância e adolescência por ali encontrava. Ainda conhecia (e ainda conheço) os locais onde cresciam os medronheiros, um arbusto ou pequena árvore de folha perene, que ostenta cores e empresta sabores aos matagais e florestas mediterrânicos.  

Passava na orla do rio, junto a uma zona íngreme  onde o rio se estrangulava numa garganta apertada, precipitando-se num abismo, espalhando gotículas pelas margens, quando avistei finalmente o local onde antes me deleitava por momentos a contemplar os silêncios e aromas da mãe natureza.


Memórias do meu palácio


Uma rocha em forma de casa, junto ao rio, com uma entrada suficientemente grande, pela qual me podia introduzir naquela rocha oca. Dirigi-me para ali e recordei as brincadeiras de criança. Fiquei deveras contente por verificar que ainda ali restavam indícios de objectos por mim ali deixados. Pedaços de madeira esculpida; pinhas; lápis; papelões e partes de uma guitarra de plástico, que me havia sido oferecida pela minha mãe, tinha eu 7 anos. Foi tão bom rever aquele local místico, o meu palácio, que eu havia ornamentado e escondia do resto do mundo. Era o meu universo, onde me presenteava com o imaginário, divagando por mundos por mim sonhados e vividos em pensamentos que me alegravam a existência. O interior da pedra é acolhedor e possui uma espécie de janela para o exterior e uma espécie de pedra rectangular, onde eu comia os medronhos que apanhava ali perto.

Foi bom recordar aquele meu “palácio secreto” onde sonhei em criança. Mas o que me transportou aquelas paragens, localizadas perto do moinho de meus pais, foi o encontro com o medronheiro situado junto a um sobreiro; alguns carvalhos e arbustos de diversas espécies a pouco mais de 200 metros do moinho já devoluto.


O meu medronheiro

Uma alegria contagiante percorreu-me a alma. Ali estava ele o “meu” medronheiro, uma pequena árvore semelhante a um arbusto com cerca de 2 metros de altura, ostentando uma copa oval segura pelos seu ramos grossos, suportada por um troco delegado com uma casca pardo-acinzentada/avermelhada, mas já muito gretado e escamoso.

Exibia orgulhosamente os seus frutos globosos; granulosos e eriçados, apresentando a sua cor avermelhava (já maduros), apelando a serem colhidos e degustados. Até o medronheiro ficou feliz com a minha presença, visto ter passado tantos anos privado da minha presença. Acho até que os seus frutos exalaram um cheiro mais intenso e as suas folhas brilharam com mais intensidade!



Maravilhei-me com aquela visão, mas não me fiz rogado e iniciei a colheita e a degustação deste fruto que se come prazeirosamente  No entanto este fruto apresenta um teor alcoólico considerável, pelo que convém não abusar!

O medronheiro para quem desconhece, floresce entre o Outono ou nos princípios do Inverno. A maturação dos frutos ocorre no Outono do ano procedente. É nesta época, devido ao facto de a floração e a maturação dos frutos do ano anterior ser simultânea, que o medronheiro se cobre de uma "veste" colorida de grande beleza. Nas suas cores podemos encontrar o verde brilhante das folhas, o branco das flores e os frutos que são inicialmente amarelos, tornando-se vermelhos com a sua maturação.

Quem se quiser aventurar, pode sempre deslocar-se nesta época às aldeias e perguntar onde existem medronheiros que alguém os saberá informar. Felizmente Portugal é rico neste fruto, podendo ser encontrado em várias serras nacionais. Parta à aventura como eu o fiz, descubra o medronheiro e delicie-se com este fruto


Deixo aqui algumas informações sobre o medronheiro e as suas variadas utilizações, espero que seja útil …



Medronheiros e medronhos


 O medronheiro é um arbusto ou pequena árvore de folha perene, que empresta cores e sabores aos matagais mediterrânicos. É particularmente conhecido pela aguardente de medronho preparada a partir dos seus frutos.
  
TAXONOMIA
O medronheiro (Arbutus unedo L.) pertence à família das Ericaceas, partilhando-a com as urzes (Erica sp.).

CARACTERÍSTICAS MORFOLÓGICAS
É um arbusto ou uma árvore de pequena dimensão. Pode atingir os 8 a 10 m de altura ainda que usualmente não ultrapasse os 5 m.
O tronco possui um ritidoma (casca) pardo-avermelhada ou pardo-acinzentada, delgada, gretada, muito escamosa, caduca em pequenas placas nos exemplares mais velhos.
A sua copa tem uma forma oval com ramos grossos.
As folhas são persistentes (existem folhas na copa durante todo o ano), grandes (medem 4 a 11 cm), com pecíolo curto, alternadas, coriáceas, glabras, lustrosas e verde-escuras na página superior e mais claras na página inferior, serrilhadas ou subinteiras. São muito parecidas com as do loureiro.

As flores são pequenas, com um cálice curto e corola gamopetala, urceolada, esverdeadas, reunidas em cachos (ramalhetes) compostos, terminais e pendentes. Debaixo do ovário, encontramos 10 estames inseridos num disco.
Os frutos são baciformes, globosos, granulosos ou eriçados na superfície, medem entre 20 a 25 mm, de cor avermelhada quando maduros, com sementes pequenas, angulares e de cor castanha.
Floresce no Outono ou no princípio do Inverno. A maturação dos frutos ocorre no Outono do ano procedente. É nesta época, devido ao facto de a floração e a maturação dos frutos do ano anterior ser simultânea, que o medronheiro se cobre de uma "veste" colorida de grande beleza. Nas suas cores podemos encontrar o verde brilhante das folhas, o branco das flores e os frutos que são inicialmente amarelos, tornando-se vermelhos com a sua maturação.

DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA
Distribui-se por uma vasta área na bacia mediterrânica, excepto na orla costeira do Sudoeste de Espanha e na área que vai desde Tunis até ao Sul da Turquia. A sua área de distribuição inclui também todo o território de Portugal continental, o Norte de Espanha, as regiões das Landes e da Bretanha em França e a zona ocidental da Irlanda.
No nosso país, as maiores manchas situam-se nas Serras de Monchique e do Caldeirão.

CONDIÇÕES AMBIENTAIS
É uma espécie que aparece consociada às Quercíneas, particularmente ao sobreiro e à azinheira, ocorrendo nos montados e em zonas de matos resultantes da sua degradação. Crescem tanto em solos ácidos como alcalinos mas preferem que sejam profundos e frescos. Aparecem até aos 1200 m de altitude. O seu clima favorito é suave e sem geadas fortes.

UTILIZAÇÕES
O medronheiro é explorado, sobretudo nas Serras de Monchique e do Caldeirão, para a produção de aguardente. Esta é chamada de "aguardente de medronho", um produto regional sempre apresentado com brio no cabaz dos produtos regionais do Algarve. A sua cultura esteve parada durante várias décadas, tendo ressurgido com o aumento da rendibilidade da actividade de produção desta aguardente. Para tal facto contribuiu a utilização de máquinas como as escavadoras (buldozers) que permitiram cortar os medronheiros pela sua base o que estimula a rebentação pela cepa (zona do caule junto ao solo que "sobrevive" ao corte). O pico de produção verifica-se no 3º ano da planta, mantendo-se a níveis economicamente viáveis durante mais 5 a 8 anos. Ao fim de 15-20 anos, torna-se necessário removê-los para que sejam substituídos. Esta remoção, realizada nos moldes acima explicados, ainda que seja rápida e pouco onerosa provoca o arrastamento das camadas superficiais do solo com a sua consequente maior susceptibilidade aos agentes erosivos.
 O fruto é comestível e com ele pode-se preparar uma aguardente de excelente qualidade (aguardente de medronho). As folhas são usadas na medicina popular pelas suas propriedades diuréticas e anti-sépticas. As folhas e a casca são muito ricas em taninos e eram usadas para curtir peles. A sua madeira é apreciada para fabricar carvão vegetal.

Esta espécie aparece, normalmente, com porte arbustivo, podendo no entanto, com a idade e quando as condições ecológicas são favoráveis, aparecer como pequena árvore.
A produção do medronheiro é, apesar de tudo, bastante irregular dado que está dependente de dois factores aleatórios, alheios a qualquer medida de gestão: as geadas e a existência de anos de safra e contra-safra (grande produção de fruto e baixa produção de fruto em anos sucessivos). Os medronhos (frutos) são destilados em alambique, sendo necessários 15 kg para produzir 15 l de aguardente.
As folhas e casca do medronheiro contêm taninos que são utilizados para curtir as peles e, na medicina popular, para curar as diarreias, as desinterias e as infecções urinárias.
A sua madeira constitui um excelente combustível sendo também boa para tornear.

CURIOSIDADES
Qual a origem das designações do género Arbutus? E do epíteto específico unedo ?
São ambas antigas denominações romanas nas quais Lineu se baseou para atribuir este nome à planta. O primeiro é o diminuitivo de arbor e significa arbusto. Alguns autores discordam e afirmam que a origem etimológica encontra-se no termo celta, arbois que significa áspero, rude, aludindo aos seus frutos.
A resposta à segunda pergunta pode ser encontrada no facto de os seus frutos, ainda que comestíveis, possuírem um sabor desagradável (quando verdes). Unedo significa "um e mais nenhum" e foi adoptado para esta espécie de modo a avisar os mais temerários que o desejem provar, de que não gostarão de repetir a experiência uma segunda vez.
Os medronhos são também famosos pela capacidade de provocar embriaguez e dor de cabeça a quem consome muitos, uma vez que quando maduros, possuem uma certa quantidade de álcool.

Atenção: Os medronhos são também famosos pela capacidade de provocar embriaguez e dor de cabeça a quem consome muitos, uma vez que quando maduros, possuem uma certa quantidade de álcool.

Curiosidades:
Aguardente do Medronho:
A aguardente de medronho (medronheira) é produzida a partir dos frutos com o mesmo nome (medronho) que se cultivam nas serranias do Algarve. Pode dizer-se que é uma bebida regional. No entanto também se produz noutras zonas do país, embora em menos quantidade.


A produção
A fruta é fermentada em tanques de madeira ou barro. Actualmente a fermentação também se faz em depósitos de cimento, mas só em destilarias de significativa dimensão. A fermentação é natural e dura entre trinta a sessenta dias. Os tanques devem ser cobertos com frutos esmagados para evitar o contacto com o ar. É necessário adicionar uma parte de água para cinco partes de fruta. Depois de fermentado o produto deve ser guardado durante sessenta dias e bem protegido do ar. Hoje em dia existem destilarias semi-industriais. No entanto, a melhor aguardente é aquela que é produzida por destilação descontínua (fogo directo).
Uma boa aguardente de medronho é transparente, com o cheiro e o gosto da fruta.
Nas montanhas, uma boa aguardente deve ter 50º.
No entanto a sua comercialização faz-se entre os 40º e 50º.
                           
 Envelhecimento
A qualidade da aguardente aumenta quando esta é amadurecida/envelhecida em barris durante oito anos. Este período de envelhecimento não deverá ser prolongado por mais tempo pois não terá qualquer efeito na qualidade da aguardente.
O medronho bebe-se, normalmente, com o café. Os puristas consideram que deve ser bebido à temperatura ambiente, embora algumas pessoas prefiram bebê-lo frio.
O famoso licor algarvio Brandymel é feito com medronho.
           
Uma lenda...
 HISTÓRIA DO PEDIDO QUE O DIABO FEZ A DEUS
O Diabo julgava-se inteligente e andava sempre à espreita para ver se apanhava alguém distraído para pregar as suas partidas.
Um dia ele, pensando que Deus estivesse distraído, fez o seguinte pedido:
- Ó Senhor, vós que possuis tantas árvores oferecei-me duas, o medronheiro e a laranjeira.
O Senhor disse-lhe:
- Pede as árvores quando não tiver flor nem fruto.
Mas a laranjeira e o medronheiro têm sempre flor ou fruto, se calhar até as duas coisas ao mesmo tempo. Por causa disso, o Diabo nunca mais pode voltar a falar nessas duas árvores.


Licor de medronho

Medronhos apanhados, lavadinhos e prontos para o preparado.


É necessário 1 litro de álcool para licor
1 kilo de medronhos
1 kilo de açúcar (eu utilizo açúcar amarelo)


Há várias maneiras de preparar o licor,
 1.º Mistura-se o álcool e os medronhos
2.º Um mês depois acrescenta-se 1,5 kg de açúcar amarelo
3.º Aguarda-se mais um mês filtra-se o licor retirando-se os medronhos.
4.º Deixa-se apurar mais dois meses e pode saborear.


Fontes:http://naturlink.sapo.pt/Natureza-e-Ambiente/Fichas-de-Especies/content/Medronheiros-e-medronhos?bl=1
http://www.rio-dao.de/home-pt.html

2 comentários:

  1. João, ao ler esta crónica tive a nítida sensação de ouvir o barulho do rio e sentir o cheiro do mato.
    Quero com isto dizer que escreves muito bem e que, por isso, espero continuar a ler mais coisas tuas.
    Parabéns!

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  2. Obrigado pelo teu comentário Isabel. Fico feliz que tenhas gostado!

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