I - O Virgílio
Desde sempre habitam nas minhas memórias
aquelas figuras míticas, que fazem já parte da própria aldeia e até da sua cultura,
sendo estes livros escritos de outros tempos.
Tive o prazer de reencontrar o Virgílio,
figura intemporal da aldeia e com quem ocasionalmente privo. Os anos não lhe perdoaram,
como não poupam ninguém na sua escalada para a velhice. Um homem que vive
sozinho, com as suas amarguras, mas seguramente feliz com a vida que ostenta,
pois nunca foi um homem de nariz empinado, mas sim o que de mais humilde pode
ser encontrado por aquelas paragens.
Trata-se de alguém que vive apegado às suas
raízes que brotam os seus sentimentos naquela terra que é também o seu berço.
Foi sempre uma figura muito acarinhada, um homem íntegro, que fugia da
maledicência e da intriga que prolifera por todo o lado, pois todos somos
diferentes, pensamos e sentimos de maneira diferente.
Faz parte do cardápio turístico e presencial
de uma aldeia que vai perdendo a sua identidade que se escoa com o emagrecimento
populacional de uma aldeia que outrora teve uma vida rural muito activa e com
muita juventude. Tempos em que ainda se faziam bailes no café do Senhor Eduardo
e da Senhora Maria que por força da vida deixaram de explorar o
estabelecimento.
II – O João e o Zé
Recentemente mais duas almas foram tragadas
pelas trevas que enublaram a pacatez da aldeia, cobrindo de luto a família de
residentes da aldeia.
Atravessaram o rio da morte com auxílio do
barqueiro a quem não terão pago de bom grado tal viagem. Primeiro foi o Zé,
logo acompanhado dias depois pelo João que não aguentou a dor visceral de
perder o irmão, sendo deste muito dependente. Um vazio habita agora na casa com
as dependências amorfas e sem pingo de vida. Foi esse cantinho que habitaram
desde que me conheço, agora ocupado por um silêncio entristecido, com cheiro a
morte, que se entranhou naquela casa e noutras que viram as almas dos seus
habitantes partir.
Recordo-me com saudade das suas feições, dos
seus sorridos e da sua educação para comigo, apesar de se tratarem de pessoas
humildes perante a vida. Quanto ao João falava pouco e tinha alguns problemas
que lhe limitavam o contacto com as gentes, pelo menos dos tempos que com ele
privei foi essa a impressão que me causou. Foram homens rústicos, trabalhadores
do campo, cumprindo as tarefas que os campos exigiam, deslocando-se a pé para
os terrenos na aldeia e para outros da aldeia vizinha – Vassal.
III- Conclusão
Todos eles são ou foram postais ilustrados de
uma vida pacata e pachorrenta que corre sem pressas e que bem descrevem o rosto
de uma aldeia que já viveu tempos de prosperidade. Apesar das várias
intervenções ali levadas a efeito, muitas revelaram-se desastrosas e dúbias na
minha modesta opinião e que levantam muitas questões éticas e deontológicas de
algumas gentes menos humildes e a quem a verdade foge para um canto, escondida
em malabarismos sombra de atitudes menos próprias.
Mas isso não importa para esta crónica, pois
o que pretendo é homenagear os acima visados que merecem toda a minha estima.
São
aliás memórias que valem a pena recordar e alimentar sempre que é possível!
Felizmente no caso do Virgílio apesar de ser um fumador inveterado, temos ainda
o prazer de o ter no mundo dos vivos e que tal se verifique por muitos e bons
anos.
Como disse revi-o, numa manhã de final de Junho do ano corrente, quando
me deslocava para o Vale do Silêncio para velar pela alma dos ente-queridos que
já partiram.
Quanto ao Virgílio, esse continua a ser quem
é … ele próprio!
João Salvador – 28/06/2014
adoro ler o teu blog “as crónicas de um homem do norte” Salvador palavras que tem tanto valor ,
ResponderEliminarMuito obrigado. Forte abraço!
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